A busca por sentido da vida em "O deserto dos Tártaros"!
Como é bom quando um
livro que você há muito tempo queria ler supera as expectativas. Eis o caso do
romance "O deserto dos tártaros", do escritor italiano Dino Buzzati
(1906-1972). Temos nessa narrativa uma obra prima da literatura.
O texto é narrado na
terceira pessoa e narra a trajetória do oficial Giovanni Drogo e sua vida no
forte Bastiani; local onde vai exercer seu trabalho e no qual se desenrola o
sentido da sua vida, um espaço fantasmagórico, no qual em frente localiza-se o
deserto dos tártaros, de onde se espera a chegada de tropas inimigas e de um grande
confronto. No entanto, essa espera é marcada por uma cortante ausência e uma
rotina esmagadora.
Neste sentido, esse
espaço é uma bela alegoria de uma busca por sentido na vida. Ao não localizar
precisamente para o leitor a geografia e o contexto histórico, a voz narrativa reforça
o caráter metafórica do enredo.
Apesar da economia de
eventos e da aridez textual, a narrativa é magistralmente bem escrita e de
final arrebatador. A passagem final lembra o conto “A terceira margem do rio’,
de Guimarães Rosa, aliás, um dos textos mais belos da língua portuguesa.
Recomendo a leitura!
O livro foi publicado
originalmente em 1940 e no Brasil em 1986, fruto de muito esforço da tradutora
Aurora Fornoni Bernadini, que usava o fato do crítico literário Antonio Candido
afirmar que lia o livro pelo menos uma vez ao ano como argumento para convencer
os editores a bancarem a publicação da obra no Brasil. Que coisa!
O melhor foi localizar o
livro num sebo da cidade por cinco reais, diversão prazerosa e reflexiva garantida
a um preço camarada.
Enfim, um livraço! Um dos
melhores romances que li na vida. Tal obra também pode ser lido como uma sugestiva metáfora sobre o vazio da rotina do nosso dia a dia. O próprio Buzzati afirmou em entrevista
que o texto surgiu de reflexões em torno de sua vida, a qual vinha sendo consumida
pelo excesso de trabalho no jornal onde era empregado e que levava embora grande parte
do seu tempo e de suas energias.
Passagem que retrata o
reencontro de Drogo com Maria e a constatação de uma possível estória de amor
esvaída pelo inclemente passar do tempo:
"No entanto restava-lhe, enquanto se dispunha a deitar na cama, uma impressão amarga, como se o afeto de outrora tivesse sido embaciado, como se entre ambos o tempo e a distância tivessem lentamente estendido um véu de separação" (BUZZATI, 1986, p.158).
Fonte: BUZZATI, Dino. O deserto dos Tártaros. Trad. de Aurora Fornoni Bernadini. Rio de Janeiro: Gráfica Rio, 1986.
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